Entre revolução e escravidão: A história do conceito jurídico de desapropriação no século XIX
DOI:
https://doi.org/10.21527/2176-6622.2024.62.15520Palabras clave:
desapropriação, história dos conceitos, abolição, revolução liberal, direito de propriedadeResumen
O presente artigo busca responder à inquietação sobre as causas que levaram, no Brasil do século XIX, a uma ativa discussão política e legislativa sobre a desapropriação. Tal ocorre em oposição à permanência de práticas atreladas ao antigo sistema de sesmarias, que resolvia de outras maneiras os conflitos entre Coroa e sesmeiros/proprietários. As hipóteses confirmadas foram a de um movimento liberal que buscou a proteção da propriedade privada; e outro, dos movimentos abolicionista e escravista, que discutiram – ao menos até 1870 – a indenização pela libertação de escravizados e, após, por meio do instrumento da desapropriação, formas de fixar capital e mão de obra liberta no espaço. Enquanto os movimentos liberais positivaram a desapropriação, de forma genérica e restritiva, como oposição a estratégias e privilégios da Coroa, o movimento abolicionista deu concretude à desapropriação como dispositivo de proteção/exclusão (senhor/negro; indenizável/ruinoso; proprietário/possuidor).
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